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POEMA À MODA DE CISCO

(pelos 100 anos do poeta Manoel de Barros)

by fotógrafa Adriana Lafer - no livro "Arquitetura do Silêncio"

§01

já ouvi pelo cheiro a cor
por onde a crisálida dorme
e depois se desfaz mariposa,

sei - quase por instinto
encontrar um azul escondido
com jeito de ser borboleta,

isso que a humanidade tem
de perder tempo com números
somas, leis, e importâncias...

melhor é fugir da canseira
que nem fui sonhar acordado
nos ombros das ribanceiras.

§02

havia uns olhos a vigiar
no meio do mato, e pelo céu
as coisas que ninguém via,
Manoel de Barros (1916 - 2014)

tinha na cabeça esse véu
feito das asas de um sabiá
tons de tarde e ave-marias,                                                   
de repente, mundo acabou-se
e o que sobrou foi pedra
flor, e canto de passarinho,

foi então, quase alvorada
que o tempo desaguou o Homem
no rio de não estar sozinho.

§3

só menino faz a vida existir
com pedaço de coisa esquecida,

o cadarço do sapato é corda
de laçar besouro, e lagartixa,

papel vira pipa no arco-íris
o seu quintal é outro planeta,

pega o galho torto da árvore
e logo o transforma em caneta,

e se põe a desenhar inventices
cujo propósito, a cada risco,

é procriar no mundo a poesia
com as “fulgurâncias” do cisco...


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